26 Aug
26Aug

A palavra sexualidade traz um alerta à psique. Seja interesse ou rejeição, uma reação acontece quando em contato com o termo. Mas, por quê temos tanto afeto por esta? Tratemos do seu conceito e do preconceito que a envolve.

Vale a pena questionarmos a nós mesmos sobre seu significado. Para isso, podemos buscar algumas definições mais usuais. Poderia ser entendida tão somente como um conjunto características físicas e morfológicas conforme o sexo a que pertence o indivíduo? Para alguns basta, mas o raso não traduz. Há que somar.

Então, que somemos um conjunto de fenômenos da vida sexual e tudo que de mais abrangente sua imaginação possa alcançar. Ainda, que coloquemos mais no pacote, como a expressão de instintos ou atividade sexual. Mesmo assim, não temos a completude do conceito que buscamos. A pista para tal está na regressão.

Os prazeres da vida já se iniciam dentro do útero materno. Em um mundo agradável, completamente saciado pelo alimento que chega ao bebê sem necessidade de buscar ou mesmo de deglutir; com temperatura controlada; espaço que permite seus poucos movimentos necessários; proteção contra impactos e ruídos abafados pela bolsa protetora.

Por regra da natureza o estado de conforto pleno se rompe e acontece o nascimento que por si só agride. Mas continuamos em busca do prazer. Nascidos, temos que nos adaptar às novas condições e os órgãos sensoriais começam a se aguçar. O tão importante e prazeroso colo, a fala calma dos genitores e principalmente o alimento buscam a manutenção do estado anterior. É descoberta a oralidade e a satisfação que dá a ingestão, além do ato em si comprovado pela vontade levar tudo à boca.

O desenvolvimento continua e evolui para uma fase em que as atenções se deslocam para os esfíncteres. Neste período o bebê já consegue explorar o ambiente, locomover-se, atender pelos mais diversos estímulos. A partir de um treinamento imposto pelos pais, a criança aprende como e quando deve conter as atividades de evacuação. O aprendizado também envolve prazer na contenção e liberação. Essa fase prepara para a posterior, quando se passa a entender sobre o funcionamento dos genitais.

Os genitais são o foco na fase fálica. A visão se aguça pela curiosidade com a região genital. As comparações entre meninos e meninas acontecem. Os afetos direcionados aos genitores se tornam mais sensíveis e uma busca pela compreensão dos amores começa a se estabelecer.

Até aqui descrevemos muito brevemente as três primeiras fases do desenvolvimento psicossexual trazido nas teorias de Freud. Não há objetivo de aprofundar esses conceitos, mas tão somente exemplificar o fato de que desde que nascemos, em cada etapa, sentimentos estão envolvidos. Todo aprendizado também envolve o sentimento. A forma como captamos cada informação dá o tom para uma música que virá. Cada marca mnemônica carrega uma emoção. Ou, de outra forma de ver, a própria emoção é o marcador, rótulo da informação.

O que nos traz prazer queremos repetir. O que é desprazer, evitamos. Mas o que fazer com o que dá prazer e foi aprendido como proibido? As frustrações são necessárias para adaptar-se à sociedade, mas a marca do prazer existe e pulsa. Então, já desenvolvido, o que não pode ser totalmente satisfeito está recalcado e é transformado em neurose, ou de forma diametralmente oposta, satisfeito pela criação do fetiche.

Aqui, o adulto se depara com as dificuldades para pôr em prática todo o aprendizado anterior. Recorrendo novamente a Freud, o dilema surge pelo princípio do prazer quando se tem a necessidade de satisfazer funções biológicas e psicológicas evitando sofrimentos.

O sofrimento gera um novo debate, mas o que nos importa é o foco sobre o como aprendemos, funcionamos e estamos ligados à vida. O que nos impulsiona. Para fechamento do conceito que estamos construindo temos a pulsão de vida. Dentro desta, Freud põe as funções de autoconservação e sexuais. A energia libidinal é parte da nossa constituição situada entre o corpo e a mente que nos faz presentes. É por ela que seguimos em frente.

Seguimos assim, satisfazendo pulsões. A sexualidade está contida na vida. E, de novo, o que é a sexualidade? É tudo o que se aprendeu até aqui para se manter vivo. Vivo no melhor conceito. É o conjunto de relações com as pessoas e com o ambiente para permitir uma presença confortável e satisfatória no mundo. 

A Organização Mundial de Saúde (OMS), em 1975, define sexualidade como “energia que motiva a encontrar o amor, contato e intimidade e se expressa na forma de sentir, nos movimentos das pessoas e como estas se tocam e são tocadas”. Mesmo tendo visto lógica sobre o que nos brindam teorias, a forma como cada um de nós enxerga o mundo e tem prazer é cercada de subjetividade.

É justamente essa subjetividade que proporciona o surgimento do preconceito. A possibilidade de identificação com o outro se extingue a partir do fato em que o processo de aprendizado da sexualidade se dá para cada um com estímulos distintos. O confortável estabelecimento de padrões não é cabível e deixa instável a concepção do que é ou não verdade.

Não se pode desprezar o medo das fragilidades. Todos temos pontos fortes e fracos. Ao atestar alguma fragilidade corre-se o risco de tornar-se inferior. Entra em jogo o Narciso de cada um e quanto mais ele estiver presente mais difícil será a aceitação da diversidade; pois para o narcisista o mundo seria melhor se todos fossem como ele.

Como é um conceito muito gasoso, é facilmente deturpado por entidades que utilizam como força repressora e pode instalar-se na base cultural, gerando mecanismo de dominação.

O preconceito é fruto do desconhecido e do medo de um mal que o objeto proporcione. Nasce daquilo que o indivíduo não consegue explicar.  

A reflexão sempre será bem-vinda quando a ciência acompanhar e o preconceito não faz uso desta. Fica para o momento, a vontade de que aprendamos que nem tudo precisa de entendimento completo para que se viva em harmonia.



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